Mario Vargas Llosa Quote

Mas don Rigoberto sabia que não havia outro remédio, tinha que se resignar e esperar. Provavelmente as únicas brigas do casal ao longo de todos os anos que estavam juntos foram causadas pelos atrasos de Lucrecia sempre que iam sair, para onde fosse, um cinema, um jantar, uma exposição, fazer compras, uma operação bancária, uma viagem. No começo, quando começaram a morar juntos, recém-casados, ele pensava que sua mulher demorava por mera inapetência e desprezo pela pontualidade. Tiveram discussões, desavenças, brigas por causa disso. Pouco a pouco, do Rigoberto, observando-a, refletindo, entendeu que esses atrasos da esposa na hora de sair para qualquer compromisso não eram uma coisa superficial, um desleixo de mulher orgulhosa. Obedeciam a algo mais profundo, um estado ontológico da alma, porque, sem que ela tivesse consciência do que lhe ocorria, toda vez que precisava sair de algum lugar, da sua própria casa, a de uma amiga que estava visitando, o restaurante onde acabara de jantar, era dominada por uma inquietação recôndita, uma insegurança, um medo obscuro, primitivo, de ter que ir embora, sair dali, mudar de lugar, e então inventava todo tipo de pretextos - pegar um lenço, trocar a bolsa, procurar as chaves, verificar se as janelas estavam bem fechadas, a televisão desligada, se o fogão não estava acesso ou o telefone fora do gancho -, qualquer coisa que atrasasse por alguns minutos ou segundos a pavorosa ação de partir.Ela sempre foi assim? Quando era pequena também? Não se atreveu a perguntar. Mas já havia constatado que, com o passar dos anos, esse prurido, mania ou fatalidade se acentuava, a tal ponto que Rigoberto às vezes pensava, com um calafrio, que talvez chegasse o dia que Lucrecia, com a mesma benignidade do personagem de Melville, ia contrair a letargia ou indolência metafísica de Bartleby e decidir não mais sair da sua casa, quem sabe do seu quarto e até da sua cama. Medo de abandonar o ser, de perder o ser, de ficar sem seu ser, pensou mais uma vez. Era o diagnóstico que havia chegado em relação aos atrasos da esposa.

Mario Vargas Llosa

Mas don Rigoberto sabia que não havia outro remédio, tinha que se resignar e esperar. Provavelmente as únicas brigas do casal ao longo de todos os anos que estavam juntos foram causadas pelos atrasos de Lucrecia sempre que iam sair, para onde fosse, um cinema, um jantar, uma exposição, fazer compras, uma operação bancária, uma viagem. No começo, quando começaram a morar juntos, recém-casados, ele pensava que sua mulher demorava por mera inapetência e desprezo pela pontualidade. Tiveram discussões, desavenças, brigas por causa disso. Pouco a pouco, do Rigoberto, observando-a, refletindo, entendeu que esses atrasos da esposa na hora de sair para qualquer compromisso não eram uma coisa superficial, um desleixo de mulher orgulhosa. Obedeciam a algo mais profundo, um estado ontológico da alma, porque, sem que ela tivesse consciência do que lhe ocorria, toda vez que precisava sair de algum lugar, da sua própria casa, a de uma amiga que estava visitando, o restaurante onde acabara de jantar, era dominada por uma inquietação recôndita, uma insegurança, um medo obscuro, primitivo, de ter que ir embora, sair dali, mudar de lugar, e então inventava todo tipo de pretextos - pegar um lenço, trocar a bolsa, procurar as chaves, verificar se as janelas estavam bem fechadas, a televisão desligada, se o fogão não estava acesso ou o telefone fora do gancho -, qualquer coisa que atrasasse por alguns minutos ou segundos a pavorosa ação de partir.Ela sempre foi assim? Quando era pequena também? Não se atreveu a perguntar. Mas já havia constatado que, com o passar dos anos, esse prurido, mania ou fatalidade se acentuava, a tal ponto que Rigoberto às vezes pensava, com um calafrio, que talvez chegasse o dia que Lucrecia, com a mesma benignidade do personagem de Melville, ia contrair a letargia ou indolência metafísica de Bartleby e decidir não mais sair da sua casa, quem sabe do seu quarto e até da sua cama. Medo de abandonar o ser, de perder o ser, de ficar sem seu ser, pensou mais uma vez. Era o diagnóstico que havia chegado em relação aos atrasos da esposa.

Related Quotes

About Mario Vargas Llosa

Jorge Mario Pedro Vargas Llosa, 1st Marquess of Vargas Llosa (born 28 March 1936), more commonly known as Mario Vargas Llosa (, Spanish: [ˈmaɾjo ˈβaɾɣas ˈʎosa]), is a Peruvian novelist, journalist, essayist and former politician. Vargas Llosa is one of Latin America's most significant novelists and essayists and one of the leading writers of his generation. Some critics consider him to have had a larger international impact and worldwide audience than any other writer of the Latin American Boom. In 2010, he won the Nobel Prize in Literature, "for his cartography of structures of power and his trenchant images of the individual's resistance, revolt, and defeat." He also won the 1967 Rómulo Gallegos Prize, the 1986 Prince of Asturias Award, the 1994 Miguel de Cervantes Prize, the 1995 Jerusalem Prize, the 2012 Carlos Fuentes International Prize, and the 2018 Pablo Neruda Order of Artistic and Cultural Merit. In 2021, he was elected to the Académie française.
Vargas Llosa rose to international fame in the 1960s with novels such as The Time of the Hero (La ciudad y los perros, literally The City and the Dogs, 1963/1966), The Green House (La casa verde, 1965/1968), and the monumental Conversation in the Cathedral (Conversación en la catedral, 1969/1975). He writes, prolifically, across an array of literary genres, including literary criticism and journalism. His novels include comedies, murder mysteries, historical novels, and political thrillers. Several, such as Captain Pantoja and the Special Service (1973/1978) and Aunt Julia and the Scriptwriter (1977/1982), have been adapted as feature films.
Many of Vargas Llosa's works are influenced by the writer's perception of Peruvian society and his own experiences as a native Peruvian. Increasingly, he has expanded his range, and tackled themes that arise from other parts of the world. In his essays, Vargas Llosa has made many criticisms of nationalism in different parts of the world. Another change, over the course of his career, has been a shift from a style and approach associated with literary modernism to a sometimes playful postmodernism.
Like many Latin American writers, Vargas Llosa has been politically active throughout his career. While he initially supported the Cuban revolutionary government of Fidel Castro, Vargas Llosa later became disenchanted with its policies, particularly after the imprisonment of Cuban poet Heberto Padilla in 1971, and now, he identifies as a liberal and holds anti-left wing ideas. He ran for the Peruvian presidency in 1990 with the center-right Frente Democrático coalition, advocating for neoliberal reforms but lost the election to Alberto Fujimori. Since his exit from directly participating in politics in Peru, Vargas Llosa has advocated right-wing activists and candidates internationally.
Vargas Llosa is also one of the 25 leading figures on the Information and Democracy Commission launched by Reporters Without Borders.